Empresa que analisa o comportamento digital de menores de 18 anos relata que jovens ficam tristes sem a presença dos amigos na pandemia.
Neusa Spaulucci
O Kidscorp, empresa que analisa o com-portamento digital do público infanto–juvenil, ou seja, faixa que compreende os menores de 18, concluiu em recente estudo sobre como essa turma se sente sem as au-las presenciais durante a pandemia. A gran-de maioria diz sentir falta de ir à escola por conta de interação com os colegas. Quanto menores são, mais tristes ficam, já que seus pais evitam os encontros nos quais eles po-dem brincar com os amigos. Outro dado interessante da pesquisa é que as meninas do segmento tween (9-12 anos) e teen (13-17 anos) foram as mais preocupadas em relação à pandemia e, de modo geral, as que mais sentiram falta das aulas presenciais.
Outro detalhe que chama a atenção é o au-mento do número de crianças e adolescentes que passaram a usar a internet neste perío-do. Demian Faletschi, CEO do Kidscorp, se apóia em análises da Unicef, realizadas antes da pandemia, que já estimavam que, em ní-vel global, de cada três usuários de internet, um era menor de 18 anos. “Os dados mos-tram que houve um aceleramento a partir de dois principais fatores: educação em casa e o tempo de ócio dentro dos lares”, analisa o executivo. Ele volta ainda ao primeiro ponto para fundamentar sua tese: “a educação de mais de 1,6 bilhão de estudantes se viu afe-tada pela Covid-19, em função do fechamen-to total ou parcial das escolas, e à mudança para uma educação digital, que trouxe como consequência a adoção massiva e forçosa de plataformas educativas como o Google
Classroom ou o Edmodo”.Já em relação ao tempo livre, segundo ele, “ficar em casa obrigou que todas as ati-vidades realizadas fora do lar encontrassem algum substituto para entretenimento den-tro dele, aumentando assim o tempo de uso dos dispositivos e consumo de conteúdos”. “Seja jogando por meio de celulares, tablets e consoles ou assistindo a vídeos. Durante o primeiro mês da pandemia registramos um aumento de cerca de 80% no índice de cone-xões das crianças no Brasil”.Faletschi relata que hoje o mercado vive abaixo desses picos, porém, de forma ge-ral, “fala-se muito que a pandemia acelerou entre três e cinco anos a adoção do digital”. “Sem dúvida nos espera uma nova normali-dade mais conectada”, afirma.A pesquisa mostra ainda que tanto as crianças como os adolescentes usam muito a internet para jogar, o que, para ele, de maneira geral, o jogo é vital para o correto desen-volvimento de qualquer indivíduo. “Sem jo-gar não há desenvolvimento e aprendizagem possíveis durante a infância. À medida que vamos crescendo, a aprendizagem vai assu-mindo também um papel independente fora dos jogos, porque, inclusive na vida adulta, continuamos incorporando conhecimentos e habilidades através deles”, afirma. Segundo ele, nas últimas décadas, os dis-positivos conectados assumiram papel de protagonismo no que diz respeito a jogar, trazendo novos desafios e oportunidades. “Em relação aos desafios, podemos desta-car o enfrentado por muitos pais no que diz respeito à atenção de uma criança às ativida-des educativas, quando elas competem pelo tempo de atenção com consoles ou mesmo o YouTube”, argumenta. Ele diz ainda que, por outro lado, graças ao acesso cada vez mais universal a dispositi-vos e à internet, foi possível levar educação a mais crianças através dos jogos. “O ‘edutain-ment’, ou entretenimento educativo, diz res-peito a todo conteúdo educativo combinado a elementos lúdicos para entreter, e permi-te que um aluno se sinta motivado durante o processo de aprendizagem, oferecendo a também, com os quais ele possa se divertir enquanto aprende”, diz o executivo, acres-centando: “Acredito que é muito importante encontrar o equilíbrio entre jogar e educar, de modo que possam ser desenvolvidas ha-bilidades e o conhecimento adequados em cada uma das etapas de desenvolvimento”. PREOCUPACAO Ele declara que a pesquisa aponta que as crianças sentem falta de ir à escola e de interagir com seus amigos e companheiros. “Notamos que a conversa relacionada ao colégio é crescente, logo vemos que o retor-no às aulas é algo que realmente os preocu-pa”. O executivo conta ainda que observou que as meninas pré-adolescentes e adoles-centes foram as mais preocupadas com a pandemia e, de maneira geral, as que mais sentiram falta da escola.Outro destaque do estudo é o papel de-sempenhado pelos médicos na pandemia e ser “doutor” se tornou uma aspiração má-xima de crianças e adolescentes quando perguntados, segundo o CEO, sobre o que queriam ser quando crescessem.Mais um dado relevante apontado na pesquisa é a crescente taxa de uso de smar-tphone entre os menores, e “ela se manteve elevada, ainda que com uma pequena que-da nos últimos meses pelo cansaço do uso de telas por parte dos adolescentes”.O executivo diz ainda que as crianças preferem jogar videogames como um ele-mento social, como o chat – existente no Minecraft e Roblox, por exemplo, que tam-bém estimulam a criatividade. “Isso pode-ria ser entendido como uma necessidade de se socializar, fruto da impossibilidade de encontrar amigos com a frequência que es-tão acostumados”, analisa. O uso e interação em jogos nos celulares dobrou desde a instalação das medidas de isolamento social, segundo ele. Nos últi-mos meses do ano diminuiu o uso de jogos, mas cresceram ou se mantiveram outras atividades, como assistir a vídeos online e os aplicativos de conversa.Outro aumento constatado pelo executi-vo é a ampliação de plataformas de conte-údo educativo para todas as idades e ainda cresceu a compra de laptops, desktops e fones de ouvido. “Além disso, as crianças vão ao YouTube para aprender coisas no-vas, com tendência para vídeos educativos e tutoriais”.Faletschi destaca ainda que educação não é sinônimo de escolaridade e, se a sociedade quer garantir que as novas gerações vivam num mundo melhor, “é indispensável man-ter as escolas abertas”. “Vários estudos falam sobre os efeitos causados nas crianças que não frequentam escola, em termos de desen-volvimento, formação e, inclusive, no que diz respeito ao nível nutricional, quando fa-lamos de crianças de famílias pobres, como é, infelizmente, comum na América Latina”. Ele argumenta também que a digitaliza-ção e a tecnologia eram dívidas pendentes na educação, da qual não se deve fugir agora. “Pelo contrário, é tempo de capitalizar todos os passos dados no último ano e adotar ferra-mentas que, através do virtual, potenciem a escola presencial”.Ele diz acreditar que o virtual pode ser uma oportunidade em favor da igualdade, de modo que todas as crianças tenham as mesmas oportunidades de acessar a educa-ção. “Entretanto, nessa transformação, são imprescindíveis metas claras e mensuráveis, acompanhadas de indicadores que sinalizem progresso, principalmente entre os setores menos favorecidos”, conclui.